Por Elismar Conceição Oliveira
Logo
nos primeiros semestres do curso de Direito, o acadêmico se depara com uma
distinção basilar entre o direito público e o direito privado. O direito púbico
é guiado pela legalidade estrita e o direito privado, pela legalidade ampla. Em
apertada síntese, significa dizer: o ente público só pode praticar atos
previamente previstos na legislação, enquanto que o particular tem ampla
liberdade, ou seja, o que não é proibido pela lei é permitido.
Ocorre
que essa regra não é observada no Município de Macaúbas quando o assunto é
provimento dos cargos públicos. Explico melhor. Conforme vimos, a administração
pública está vinculada ao princípio da legalidade estrita, ou seja, somente é
permitido o que está na lei. E o que diz a lei acerca desse tema? Consultemos o
art. 37, incisos II e IX da Constituição Federal:
“II
- a investidura em cargo ou emprego
público depende de aprovação prévia
em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a
natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração;
IX
- a lei estabelecerá os casos de
contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de
excepcional interesse público;”
Sendo
assim, ressalvado os cargos comissionados, temos duas formas de vínculo: efetivo
e temporário. O servidor efetivo é aquele aprovado previamente em concurso
público para ocupação de cargos de natureza permanente, enquanto o servidor temporário
é aquele que, nos termos da lei, será contratado para atender necessidade
temporária de excepcional interesse público.
A
contratação temporária, nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal,
somente terá validade se for precedida dos seguintes requisitos, consoante
entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal: “a) os casos excepcionais
estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade
seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a contratação seja
indispensável, sendo vedada para os serviços ordinários permanentes do Estado
que estejam sob o espectro das contingências normais da Administração.”
O
que presenciamos em Macaúbas é uma manifesta e inaceitável burla à regra do
concurso público. Uma quantidade significativa de cargos públicos, a grande
maioria de natureza permanente, são providos através de contratações
(temporárias) diretas, sem prévio processo seletivo, em clara inobservância e
desvirtuamento das normas constitucionais citadas, e também aos princípios da
impessoalidade, moralidade e eficiência administrativa.
Esse
número aumenta consideravelmente a medida que se aproxima das eleições. Vejamos
os dados do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia, fazendo um
comparativo do número de servidores efetivos, comissionados e temporários de
alguns meses entre 2017 e 2019:
TCM/BA
Mês/Ano
|
Efetivos
|
Comissionados
|
Temporários
|
Setembro/2017
|
818
|
136
|
716
|
Setembro/2018
|
835
|
140
|
692
|
Abril/2019
|
840
|
133
|
824
|
Setembro/2019
|
828
|
138
|
852
|
Os
dados são alarmantes! O número de servidores temporários, contratados
diretamente sem prévio processo seletivo, em setembro de 2019, supera o número
de servidores efetivos (concursados). E pior, os ditos servidores contratados
são, a bem da verdade, tratados como subcategoria de trabalhadores, a maioria
deles sem direito a férias, 1/3 de férias e 13º salário. Um descalabro
administrativo!
No
ambiente privado, é cediço que as empresas tem ampla liberdade para contratar
os seus funcionários, não se submetendo à regra do concurso público, muito
embora o recrutamento na maioria delas seja precedido de análise curricular,
entrevista e até mesmo, em algumas organizações, de uma seleção.
Feito
essa explanação, no quesito provimento de cargos públicos, as perguntas que
ficam são: o nosso município é gerido como ente público ou como empresa privada
de quinta categoria, que descumpre as leis e nega direitos aos trabalhadores? Quais
interesses circundam a ausência de concurso público e processo seletivo para
recrutamento de servidores, efetivos e temporários?
É
fundamental lutarmos pelo acesso democrático aos cargos públicos. Deve ser
assegurado a todos os macaubenses o direito de concorrer e acessar os cargos
públicos da administração municipal, sem que para isso tenha que “prender o rabo
politicamente”. Não podemos aceitar que o Município seja gerido como uma
empresa privada, com um “dono” distribuindo os cargos a seu bel-prazer e
conveniência.
Quanto
às instituições de controle e fiscalização, temos infelizmente um Ministério
Público pouco atuante, e uma Câmara de Vereadores inoperante. Dessa última
ninguém espera muito mesmo.
Por
fim, faço apenas uma provocação: indignai-vos, macaubenses!
Elismar
Conceição Oliveira
Advogado
Sua abordagem é muito lúcida, Elismar. "Empresa de quinta categoria...". Apesar da atual desvantagem da sociedade macaubense, a tendência é a "virada de mesa". Abraham Lincoln disse: "você pode enganar alguns por algum tempo, mas não pode enganar a todos, todo o tempo ".
ResponderExcluirO Brejo liberta!